O meu filho ainda usa chupeta! E agora?
- multiclic
- 25 de jun. de 2019
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O reflexo de sucção está presente desde a vida intra-uterina e torna-se voluntário a partir dos 4 meses de idade (Tenório, Rocha, Fraga, Tenório, & Pereira, 2005). Existem hábitos de sucção considerados normais, como a amamentação, e hábitos de sucção nocivos, como o uso da chupeta, sucção digital (“chuchar no dedo”) e a sucção lingual. Ao longo dos tempos, o uso da chupeta, forma de sucção não nutritiva, tem-se tornado um grande auxílio para os pais, uma vez que proporciona conforto aos bebés e ajuda-os a acalmarem-se (Lima, Cordeiro, Justo, & Rodrigues, 2010). Todavia a utilização da chupeta deve ser ponderada e restrita a determinados momentos, como a hora de dormir, para que não se torne prejudicial.
O uso prolongado da chupeta pode interferir negativamente no crescimento craniofacial em termos ósseos e musculares, alterar a forma das arcadas dentárias, o posicionamento da língua, o vedamento labial e, consequentemente comprometer a fala, respiração, mastigação e deglutição. As alterações craniofaciais e da musculatura da face podem prejudicar a articulação das palavras. Acrescenta-se que estas dificuldades podem também advir da recusa da criança retirar a chupeta quando quer falar. A mastigação, que deveria ser bilateral alternada, passa a ser unilateral e vertical. A deglutição torna-se atípica ou adaptada, com interposição da língua e participação ativa da musculatura perioral. Por fim, a respiração assume um padrão oral, ao invés de nasal (Araújo, Silva, & Coutinho, 2009; Lima, Cordeiro, Justo, & Rodrigues, 2010; Santos, Buccini, & Sebastião, 2017). Estas alterações estão diretamente relacionadas com a frequência e duração da utilização da chupeta (Lima, Cordeiro, Justo, & Rodrigues, 2010).
Quando os progenitores decidem introduzir a chupeta devem optar por uma chupeta ortodôntica, que só deve ser introduzida após a amamentação estar bem estabelecida, uma vez que a chupeta pode provocar o desmame precoce (Arcoverde, 2001). A amamentação no peito da mãe é muito mais exigente do que a amamentação com o biberão. Assim, se o bebé estiver em fase de adaptação à alimentação no peito, a introdução do biberão ou chupeta pode conduzir à confusão de bicos. É importante ressalvar que a utilização da chupeta por crianças amamentadas naturalmente é refutada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (Lima, Cordeiro, Justo, & Rodrigues, 2010; Medeiros & Bernardi, 2011).
Tal como já foi referido, o uso indevido da chupeta é uma desvantagem para o desenvolvimento harmonioso da criança e a sua retirada deve acontecer até aos dois anos de idade (Arcoverde, 2001). Porém, este é um processo que nem sempre é fácil, uma vez que a criança estabelece uma ligação emocional e afectiva com a chupeta. O momento mais indicado deve ser bem analisado e ponderado. A retirada não deve acontecer em simultâneo com outras mudanças, tais como o desfralde e a entrada para a creche/infantário, e a criança deve ser incluída ativamente no processo, explicando-lhe a necessidade de largar este pequeno objeto.
Estratégias para retirar a chupeta:
- Pedir à criança para tirar a chupeta da boca quando quer falar, dizendo por exemplo que não compreende o que ela está a dizer;
- Não ter a chupeta à disponibilidade da criança. Este objeto só deve ser dado em momentos específicos e não deve ser pendurado na roupa;
- Diminuir os períodos de utilização de forma gradual;
- Elogiar a criança quando não utiliza a chupeta;
- Combinar com a criança um dia ou uma época festiva para deixar a chupeta. Oferecer a chupeta ao pai natal ou ao seu boneco preferido, por exemplo.
- Oferecer uma recompensa pela entrega da chupeta;
- Substituir a chupeta por outro objeto que dê conforto à criança, como um peluche.
Caso nenhuma das estratégias anteriormente referidas funcionar, pode fazer um pequeno furo na chupeta e explicar à criança que está estragada.
Durante este processo os progenitores devem estar atentos, para que a criança não substitua a chupeta pelo dedo. A sucção digital é mais difícil de extinguir, uma vez o dedo faz parte do corpo e não é removível.
Desta forma, quando a introdução ou utilização da chupeta suscita alguma dúvida, os progenitores devem consultar um Terapeuta da Fala. Este profissional de saúde pode esclarecer as dúvidas e orientá-los, no sentido de proporcionar à criança um desenvolvimento harmonioso craniofacial e de todas funções estomatognáticas (sucção, respiração, fala, mastigação e deglutição).
Vânia Vale
Terapeuta da Fala
Referências bibliográficas
Araújo, C. M., Silva, G. A., & Coutinho, S. B. (abr-jun de 2009). A UTILIZAÇÃO DA CHUPETA. Revista CEFAC, 11 (2).
ARCOVERDE, Z. L. (2001). PREVENÇÃO DOS DISTÚRBIOS DA FALA Uma propota de orientação fonoaudiológica. ITAJAÍ.
Santos, T. R., Buccini, G. d., & Sebastião, L. T. (set./out. de 2017). Fatores associados ao uso de chupeta entre filhos de mulheres trabalhadoras com creche no local de trabalho. Revista CEFAC, 19 (5).
Lima, G. N., Cordeiro, C. d., Justo, J. d., & Rodrigues, L. B. (2010). Mordida aberta anterior e hábitos orais em crianças. Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, 15 (3).
Medeiros, A. M., & Bernardi, A. T. (Jan./Mar. de 2011). Alimentação do recém-nascido pré-termo: aleitamento materno, copo e mamadeira. Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, 16 (1) .
Tenório, M. D., Rocha, J. E., Fraga, A. B., Tenório, D. M., & Pereira, P. S. (Nov/Dez. de 2005). Sucção digital: observação em ultra-sonografia e em recém-nascidos. Radiologia Brasileira, 38 (6).
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